CORRESPONDÊNCIA IMAGINÁRIA III
É alto o preço que estou pagando por ter me refugiado nos seus olhos enquanto acabava de ficar pronta para o mundo.
Por isso, digo: nos vemos qualquer hora, baby. Qualquer dia desses.Quando eu enjoar de coca-cola light, te ligo sem falta. Quando encontrar a figurinha 23 do meu álbum de países incendiados, mando-a pelo correio para você - guarde-a, por favor.
Estou com umas coisas suas aqui, mas não posso devolvê-las. Detestaria viver sem as mãos. Se bem que, talvez, parasse de escrever e sofrer.
Se seus olhos doerem muito, pense em mim. Pense em mim, quando o vidro da janela estiver embaçado por qualquer vapor.
Ah, se você descobrir como se faz para voltar no tempo, nunca se esqueça daqueles cinco dias em Buenos Aires, quando fomos tão felizes e exiladas! Volte até lá e dê uma espiadinha em nós, de mãos dadas.
Ainda mora uma menina em mim que não pára de falar que você é a coisa mais bonita do mundo. Pena que não dou mais tanta atenção a ela.
Agora você pode ir a praia descansada. Não se culpe mais por minha pele tão branca. Esqueça nossos planos de veleiros e África. Esqueça os sequestros e os reencontros alucinados. Esqueça aquela época em que você pintava borboletas e eu queria apenas ficar deitada no seu colo lendo Ligia Fagundes-Telles.Esqueça que eu nunca quis outro lugar. Esqueça que ninguém me ama como você.
Essa é a separação mais necessária da história da humanidade. E ainda assim voltaremos. Voltaremos. Com nosso abraços de milkshake de chocolate e nossos porres de marguerita, é claro que voltaremos. Nós voltaremos porque, qualquer hora dessas, ou eu ou você precisaremos de medula. E isso ainda temos para dar uma a outra, órgãos internos compatíveis.
Se eu ficar com muito medo, vou gritar seu nome mas não se sinta pressionada. Eu grito para dentro, você sabe. Mando minha carta de sucídio para o seu endereço antigo, de qualquer forma.
Não pense que.
Não se afobe não.