24.7.04

CORTAR OS PULSOS
 
Poderia ser uma ótima idéia.
Pensando bem, deve doer um pouco.
O corte.
Deve ser um pouco bonito.
Ver o sangue escorrendo.

Como as minhas mãos estão tremendo!
Horas a fio
 
Meu pensamento se tornou cíclico - e o verdadeiro nome desse fenômeno é paranóia.

Em algum lugar, meu assassino ri de mim. Escuto o eco de sua gargalhada. Ele está longe mas pode me ver.

Gás é natural - não dói nada.

19.7.04

  
 
QUERO QUE ISTO SEJA UMA CANÇÃO DE AMOR - Uma peça

 
 
Palco vazio. Um homem entra e canta - fazendo os gestos:
 
- O meu chapéu tem três pontas. Tem três pontas o meu chapéu. Se não tivesse três pontas. Não seria o meu chapéu.
 
 
O homem tira um papel do bolso e lê em voz alta:

 
 Não está acontecendo nada. Não está. Está. Alguma coisa está acontecendo. Nada. Nada está. Está acontecendo nada, não está acontecendo nada. Nada. Acontecendo. Nada acontece. Nada também acontece. Alguma coisa está acontecendo. Escrever no diário: Alguma coisa está acontecendo. Nada. Escrever no diário que eu queria que houvesse mais alguém aqui, no mundo. O mundo é muito solitário para Adão. Uma pessoa nunca deveria ser apenas uma pessoa mas sim , pelo menos duas, assim nunca ninguém estaria sozinho mas sempre em companhia de si mesmo, quer dizer, da outra pessoa que também seria. O melhor mesmo seria se cada pessoa fosse uma multidão inteira. Nunca haveria silêncio. Agora o silêncio é uma coisa muito ruim. O silêncio só é bom quando há muito tumulto, sozinho o silêncio é insuportável. Escrever no diário: é preciso falar o tempo inteiro. Falar e cantar para não ter que ouvir mais silêncio. Fazer exercícios para a voz e cantar e falar e ler em voz alta as coisas que escrevo para não ter que ouvir mais silêncio. Escrever no diário: é preciso economizar papel. Escrever no diário: ás vezes, ficar calado para ouvir novamente o silêncio e lembrar como ele é suave. Escrever no diário: nunca mais falar sozinho. Isso não é uma coisa normal. Escrever no diário: Adão. Robson Crusoé. Tom Hanks. Escrever no diário: providenciar Eva. Nunca mais mentir para mim mesmo sobre a questão do tempo, metereológico, eu quero dizer. Nunca mais pegar um resfriado. Escrever no diário: providenciar Sexta-Feira. Nunca mais mentir para mim mesmo sobre a questão do tempo. Escrever no diário: providenciar Wilson. Escrever no diário: meu diário, desculpe ter te perdido. Escrever no diário: obrigado, diz o Pluto.
 
Um forte estrondo. Entra um outro homem. O primeiro homem o ignora sumariamente.
 
Homem 2 - Meu nome é Duck. Duck Donald.
 
O homem 1 tira um minúsculo lápis e põe-se a escrever no papel que estava lendo, escreve em voz alta: 
  
Escrever no diário: apareceu um homem aqui, chamado Duck Donald. Não sou eu, é outra pessoa que não sou eu. Antes de Duck Donald aparecer houve um forte estrondo. Dever ter sido Deus. Ou um trovão. Ou um acidente aéreo.
 
Duck- Então, como você se chama? 
 
Homem - Escrever no diário: Ele perguntou meu nome. Mickey Mouse. Não sei de onde Duck Donald saiu.
 
 
Duck- Saí do papel. 
 
Homem - Ele disse que saiu do papel. Respondeu rápido e com firmeza. Deve saber o que está falando. Eu não sei de onde saí. Estou aqui há muito tempo. Sempre estive aqui, acho que não saí de lugar nenhum, acho que saí daqui mesmo, de onde sempre estive.
 
Duck- Não seja estúpido, você também saiu do papel. 
  
Homem - Ele me chamou de estúpido. Não sei o que isso quer dizer.
 
Duck - Qual o nome daquela árvore ali? 
 
Homem - Ele perguntou sobre uma árvore. Não há árvore alguma aqui. Nunca houve. Eu sempre estive sozinho. Sem árvore, sem nada.Com nada, justamente com nada.
 
Entram dois homens trazendo uma árvore, colocam-na em cena e saem.
 
Duck - Tico e Teco. 
 
Homem - Ele disse “Tico e Teco”, não sei o que isso significa. Dois homens trouxeram uma árvore. Não sei o que isso significa. As coisas estão ficando muito estranhas por aqui no momento. É preciso ficar alerta. Não posso dormir, não posso dormir. Estou ficando com muito sono, mas não posso dormir. Preciso avaliar melhor a situação antes de adormecer.
 
Duck - Não está entendendo o que está acontecendo, Mickey? 
 
Homem - Ele me perguntou se eu estou entendendo o que está acontecendo. Quer dizer, ele perguntou se eu não estou entendendo o que está acontecendo. Não. Está acontecendo alguma coisa que eu não consigo entender. Eu teria que responder a ele. Alguma coisa que não é o nada de sempre. Ele me chamou de Mickey.
 
Duck - É outro filme. 
 
Homem - Ele disse que é outro filme. Escrever no diário: Não consigo entender quase nada do que ele diz. Mas a voz dele é muito clara e ele fala muito alto, chega a doer os meus ouvidos.
 
Duck - Vai começar tudo de novo. Uma vida nova... Está entendendo? 
 
Homem - Quase não há mais espaço para escrever nessa folha. Preciso arrumar outro pedaço de papel com urgência. Estou ficando com vontade de cantar, mas não posso fazer isso na frente dele. Se ele continuar aqui, meu papel vai acabar. É preciso que ele vá embora para que eu comece a cantar e economize o papel. Talvez eu pudesse falar com ele. Não. Melhor não.
 
 
Duck Donald canta Cai, cai, balão e se diverte muito fazendo isso. 
 
Homem - Ele cantou uma música de criança. Acho que ele é uma criança. Talvez por isso diga coisas tão difíceis de entender. Preciso de papel. Preciso cantar também. Escrever no diário: Ele riu enquanto cantava Cai, cai, balão. Cai, cai, balão. Aqui na minha mão.
 
Cai um balão.
 
Duck - Vou embora. Tchau. Até a próxima. 
 
Homem - Ele está indo embora agora.
 
 
Duck sai. 
 
Homem - Ele foi embora. Duck Donald foi embora sem que eu pudesse ter entendido o que veio fazer aqui. Muito estranho. A árvore ficou. Não sei se posso cantar com essa árvore aqui, mas é preciso, se não o papel acaba.
 
Mickey guarda seu papel e seu minúsculo lápis no bolso. Tenta cantar, mas não consegue. Volta a escrever. 
 
Homem - Escrever no diário: não consigo cantar para a árvore.
 
A árvore canta Somewhere over the rainbow e se diverte fazendo isso. 
 
Homem - Escrever no diário: tudo está uma loucura! A árvore cantou uma música que eu nunca ouvi! Talvez eu tenha que me matar, não sei se posso conviver com isso.
 
Um arco íris. Entram Tico e Teco e retiram a árvore. Tico e Teco voltam e pegam o balão que havia caído. Entregam um caderno a Mickey - com a capa da Minie - e saem. Mickey fica visivelmente emocionado. Abre o caderno e põe-se a escrever em voz alta. 
 
Homem - Meu diário, me desculpe ter te perdido. Felizmente, alguém te encontrou e  trouxe de volta para mim. Estou muito feliz por você estar aqui! Não posso nem descrever o que realmente estou sentindo! (Pausa. Mickey está sorrindo) Não se preocupe, eu anotei tudo o que queria ter dito a você, nesse tempo todo de afastamento, numa folha de papel avulsa, sem nenhuma importância afetiva para mim. Pensei em você todo o tempo em que escrevia. Estou com muita vontade de cantar agora. Ainda há pouco, não estava conseguindo cantar porque estavam acontecendo umas coisas estranhíssimas por aqui. Mais tarde vou passar tudo a limpo e você vai entender o que eu estou querendo dizer. É muito bom te ter aqui novamente, meu diário, estava começando a ficar muito sozinho nesse mundo. (pausa. Mickey está em êxtase.) Obrigado, Eva. Obrigado, Sexta-feira. Obrigado, Wilson. Obrigado pela vaca.
 
Mickey canta O meu chapéu tem três pontas novamente.
 
                                               FIM 
  
  
  
    
 

15.7.04


É tudo ilusão de ser passado.


13.7.04

PRECIPÍCIO

Ficar pode ser tão precipitado quanto sair, querido.
Não me peça para esconder as chaves da porta, não vou fazer isso.

4.7.04

PRONTO, CONSEGUI!

Não consigo me sentir realmente bem em nenhum lugar. Nem sonhando. Eu preferia ter pesadelos vertiginosos. Eu preferia não estar em lugar nenhum.

1.7.04

OBJETO-CORAÇÃO II

Um homem de costas, com a cabeça encostada numa enorme parede preta. Outro, um pouco afastado do primeiro, de frente, absolutamente, imobilizado por grossas correntes. Este é cego, surdo e mudo. O outro é sagitariano, com ascendente e lua em gêmeos.

O homem com a cabeça encostada na parede - Eu escuto a sua voz dentro da minha cabeça - quase o tempo inteiro. Eu sei. Não é você. Não pode ser você. Não é exatamente sua essa sua voz que eu ouço, o tempo inteiro, dentro da minha cabeça. Sou eu quem faz você falar. Sou eu, na minha cabeça, o tempo inteiro, falando por você. Também, você não fala mais. Nem ouve. Nem enxerga. E faltaram umas coisas que eu queria te perguntar. Só que você não reage mais aos meus estímulos. Por que os pais amam os filhos? Não fala, nem ouve, nem enxerga. Não cala a boca dentro da minha cabeça, mas também não me responde nada. Por que os pais amam os filhos? Você poderia se mexer se quisesse. Sair daqui, ir para outro lugar, me deixar enfim. Eu ficaria bastante satisfeito.

Silêncio.

O homem com a cabeça encostada na parede - Não vai a lugar nenhum. Isso não vai nos levar a lugar nenhum. Vamos ficar aqui até o fim do dia. Fim do mês, fim do ano e por aí vai. Por que você não se mexe? Você parece um paralítico. Não parece surdo nem mudo nem cego, mas parece um paralítico em pé. O que foi que te paralisou desse jeito? Queria tanto que você pudesse me responder. Perguntas simples. O que foi que te paralisou desse jeito? Por que os pais amam os filhos? Por que escuto a sua voz dentro da minha cabeça quase o tempo inteiro? Me diga coisas agradáveis, por favor. Apenas coisas agradáveis. Receita de um bolo de cenoura com cobertura de brigadeiro, por exemplo. “Para fazer o brigadeiro, leve ao micro-ondas, na temperatura máxima, uma lata de leite condensado misturada com chocolate em pó e um pouquinho de manteiga. Pouca manteiga. Você tem que mexer de dois em dois minutos se não transborda e suja tudo.” Pare de cantar que você canta muito mal.

Silêncio.


O homem com a cabeça encostada na parede - Sempre fico pensando no que você estará pensando. Você agora só faz pensar, nada mais. Não fala, não ouve, não enxerga e não quer se mexer. Fica apenas pensando e é isso que te diferencia dessa parede com quem agora eu vivo. Minha parede. Um homem pensante foi no que você se transformou, no que se resumiu. E eu também fico pensando agora. Só que a sua voz dentro da minha cabeça me atrapalha um pouco os pensamentos. Me deixa confuso. Você ia gostar de se ver dentro da minha cabeça, ia gostar de se ouvir me dizendo coisas produtivas. “Faça isso, coma tudo, limpe o prato com a língua depois coloque no armário”. Será que você pensa em mim? Será que você escuta a minha voz dentro da sua cabeça lhe dizendo coisas produtivas? Apague a luz, feche a torneira, organize os cds por ordem de predileção. Perguntas simples. Por que os pais amam os filhos?

Silêncio.

O homem com a cabeça encostada na parede ( cantando) - It’s been 7 hours and 15 days / Since you took your love away / I go out every night and sleep all day / Since you took your love away / Since you’ve been gone I can do whatever I want / I can see whomever I choose / I can eat my dinner in a fancy restaurant / But nothing / I say nothing can take away these blues / Cause nothing compares / Nothing compares 2 U. It’s been so lonely whitout you here / Like a bird whitout a song / Nothing can stop these lonely tears from falling / Tell me, baby, where did I go wrong / I could put my arms around every boy I see/ But they only remind me of you / I went to the doctor n’guess what he told me /Guess what he told me/ He said, girl, you better have fun / No matter what to do / But he’s a fool / Cause nothing compares / Nothing compares 2 U / All the flowers that you plantede, mama/ In the back yard/ All died when you went away / I know that living with you, baby, was sometimes hard / But I’m willing to give it another try/ Cause nothing compares/ Nothing compares 2U.

Silêncio.

O homem com a cabeça encostada na parede - Às vezes, tenho vontade de ir embora de mim. Abrir a porta e sair. Talvez, para nunca mais voltar. Mas aí penso em você e vejo que não posso ir a lugar nenhum. Você está parado na frente da porta, tampando a saída. Cego, surdo, mudo e paralisado na frente da porta me impedindo de ir embora. É você que me prende aqui, dentro de mim. Por que os pais amam os filhos? Você pode sentir a minha dor? Minha dor. Pelo menos, eu posso senti-la. Quando abro os olhos e vejo que não restou nada no mundo todo, fico feliz em saber que ainda posso senti-la, a minha dor. Somos tudo o que temos, me and my pain. Tem você também, é claro, mas você já não faz mais parte disso aqui. Praticamente, não faz mais parte. Antigamente, você fazia. Antigamente, você podia sentir a minha dor. Antigamente. Boa palavra essa, “antigamente”. Gosto dela. Antigamente, eu gostava de você também. Agora também é uma boa palavra, mas está fora de uso na atual circunstância. Agora.


O homem com a cabeça encostada na parede cai na gargalhada.

Silêncio.

O homem com a cabeça encostada na parede - “Por que eu sou tão infeliz?” Você me pergunta. Eu, aliás. Eu, na minha cabeça, com a sua voz, me pergunto porque você é tão infeliz. E eu te pergunto outras coisinhas, com a minha própria voz, mas você se cala para mim dentro da minha maldita cabeça. Eu me calo. Eu calo a sua voz na minha maldita cabeça. O silêncio da imaginação. Eu gosto de ouvir a sua voz. É como se você ainda estivesse aqui. Aliás, você ainda está aqui, mas é como se não estivesse mais. A não ser pela sua voz dentro da minha cabeça, que nem é, de verdade, a sua voz, é como se você não estivesse mais aqui. Mexa-se, idiota! Esboce uma reação qualquer, eu não vou ficar aqui para sempre, você tem que aprender a se virar sozinho. Vou te deixar, em breve. Tenho que cuidar da minha vida, não posso mais ficar aqui te fazendo companhia. Você precisava se ouvir, dentro da minha cabeça, me implorando para não te abandonar. Reaja! Não se humilhe mais assim. É muito pior para você, cego, surdo-mudo, imóvel e humilhado, um quadro realmente deprimente. Em breve, um longo tempo, muito em breve.

Silêncio.

O homem paralisado começa a roncar.


O homem com a cabeça encostada na parede - Está dormindo... Sonhando talvez. Comigo talvez. Talvez com outra coisa. Um avião. Você sempre adorou aviões. O céu. Coisas azuis. Azuladas. Meus olhos eram azuis mas escureceram com o tempo. Os seus olhos ficaram azuis quando você ficou cego. Você nunca pode se ver de olhos azuis. Eu também não. Não posso te ver assim. Nunca mais pude te olhar de frente. Vivo de costas para você, mas você nem percebe. Nem que estou aqui, nem que estou de costas, nem nada. Você está fechado para o mundo. Queria muito que você fosse embora num avião. Para longe, muito longe. Não suporto sua companhia estável. Você nunca se altera, não se mexe, não me responde. Por que os pais amam os filhos?

Silêncio.

O homem com a cabeça encostada na parede
- Tenho chorado muito ultimamente. Por que a gente sempre tem vontade de chorar quando fica no escuro? Tenho chorado muito ultimamente. Eu sei. Não está escuro aqui. Mas é como se estivesse. Será que você chora também? Você está sempre no escuro, na cegueira. Será que não? Será que você está vendo a luz? Será que você está a salvo aí dentro da sua cegueira silenciosa e inerte enquanto eu me debato aqui na claridade dos ruídos? Bonita frase. Mas realmente gostaria de saber se você está chorando por dentro, chorando por mim. Gostaria de saber se você está sofrendo, sofrendo por mim. Eu estou. Sofrendo, quero dizer. De dor no estômago. “Autocentrado!”, você acaba de dizer.

Silêncio.

O homem com a cabeça encostada na parede
- “Lembra-se?”, você diz. Eu me lembro de tudo. Sou um verdadeiro homem-elefante, é o que eu te repondo. “Por favor, esqueça, esqueça!”, é o que você me diz dentro minha cabeça. “É você que me mantém preso aqui, paralisado, sem poder me mexer. Se eu me mexer saio correndo para longe de você”, é o que você está me dizendo, nesse exato momento, dentro da minha cabeça. “Você tem pavor de ficar sozinho é por isso que não te abandono”, é o que você continua dizendo dentro da minha cabeça, “É por isso que não morro”. Agora está calado. Esperando que eu responda. Bobagem. Bobagem. Você já disse isso antes e nada mudou. E, aliás, nem foi você quem disse isso. Fui eu. Sou eu que não quero me deixar sozinho. Sou eu, dentro da minha cabeça, que digo a mim mesmo que não quero me deixar sozinho. Só estou fingindo que é você. Usando suas antigas palavras. Suas antigas palavras. Minhas antigas boas respostas. “Vá se foder, sua estátua desgraçada!”.

Silêncio.


O homem com a cabeça encostada na parede - Boas recordações. Nossas antiguidades. O som da sua voz na minha cabeça? Isso é uma novidade. Não é tão boa assim, mas é o que nos mantém presos um ao outro. Nada mais. Apenas a sua voz dentro da minha cabeça é que me traz necessidade da sua presença. É por isso que estamos aqui, porque sou um verdadeiro homem-elefante. “Por favor, esqueça, esqueça!”. Por que os pais amam os filhos?

Silêncio.

O homem com a cabeça encostada na parede - Você sempre se cala nas horas importantes. Estou exausto. Em alguma outra hora terminamos essa conversa. Quem sabe? Algum dia. Tudo termina em algum momento. Em algum outro momento. Nós vamos conseguir resolver isso. Nosso impasse. Quem precisa de quem. Em algum momento, as coisas vão ficar claras. Não agora. Em breve, um longo tempo, em breve. Não fale nos meus sonhos, por favor. Fique quieto e me deixe descansar. Pelo menos um pouco de silêncio. De solidão. Você tem pavor de ficar sozinho é por isso que não te abandono. Nem vou te abandonar. Por enquanto. Um dia, em algum outro momento, vou. Agora só vou dormir, não tenha medo. Vou ficar bem aqui ao seu lado, o tempo todo. É apenas um soninho. Um descanso. Fique quieto e descanse você também, por favor. Depois terminamos. Não tem explicação. Não há como se explicar uma coisa dessas.

O homem com a cabeça encostada na parede deita-se no chão. O homem acorrentado abre os olhos e assovia uma canção de ninar.

QUANDO MAL ACABA

Agora que não tenho mais um time de futebol, vou me concentrar em coisas mais importantes.
Agora que não tenho mais um time de futebol, vou beber menos.
Agora que não tenho mais um time de futebol, posso ter mais bom gosto na escolha das minhas cores preferidas.
Agora que não tenho mais um time de futebol, não perderei jamais uma partida.